“Eu não amo Vicent. Amo você.”
Foram as seis palavras
mais dolorosas que li na vida. Eu não conseguia acreditar que Dora, minha
Dorota, poderia ser capaz de dizer algo dessa maneira. Tirei os olhos do papel
e encarei o rosto sem vida de Phillip, logo à minha frente. E desejei que fosse
eu ali, estirado no chão em seu lugar. E então, como que em um roteiro de
teatro, no exato momento em que esse pensamento me ocorreu, ouvi um clique leve
logo atrás de mim. Era o barulho de alguém engatilhando uma arma.
A morte. Seria ela uma
senhora encapuzada, carregando uma foice? Seria ela um anjo, com feições
bondosas? Eu esperei que ela chegasse, para abrandar a dor que me dilacerava
por dentro. Mas não veio; e eu achei que meu carrasco estaria esperando para
mostrar-me sua face.
Levantei as mãos à altura
da cabeça, depois fiquei de pé vagarosamente. Tentei respirar fundo, mas era
difícil engolir o choro. Então eu me virei. E não pude acreditar em meus olhos. Cheguei a cogitar a hipótese de
estar delirando – e queria que estivesse – mas a suposição de uma alucinação caiu
por terra quando ela falou.
– Você estragou tudo,
Vicent – o tom de Dorota era acusador.
– V-você...
– Sabe, querido, eu
cheguei a acreditar que você não seria capaz de matá-lo – ela comentou de uma
maneira descontraída, como se falasse qualquer coisa relacionada ao que eu
estava vestindo – Sempre foi um covarde! Mas eu soube manipulá-lo bem...
As palavras sumiram de
mim. Tantas indagações quiseram sair de uma só vez que acabaram congestionando a
passagem; e entalaram-se todas na garganta. E eu meramente fui capaz de encarar
o rosto sereno de Dora, com a boca semiaberta e os olhos esbugalhados de
surpresa.
– É uma pena que ele tenha
morrido, pobre coitado – ela apontou com a arma para o corpo de Phillip, depois
voltou a mirar em mim – Mas o que poderia eu fazer? – Dorota deu de ombros – Antes
ele do que eu.
– Do qu... do que v-você
está falando? – gaguejei.
Dora soltou uma risada que
ecoou pela sala de um jeito extremamente diabólico.
– Francamente, Vicent. Será
que podes ser mesmo tão cego? – ela fez uma pausa, com uma das sobrancelhas
levantadas – Você se vingou da pessoa errada. Eu matei Marcus Mason.
Meus joelhos cederam e eu
caí sobre o chão lustroso, ajoelhado diante da mulher que me enganou durante
todos esses anos. Então eu percebi que tinha matado meu próprio irmão. E que
acreditei nas palavras doces de Dorota; no jeito inocente da máscara que ela
usava, quando na verdade era uma assassina. Phillip morreu. Foi morto por um
crime que jamais chegou a cometer.
E meu pai foi assassinado pela mulher que eu amava.
Ela continuou a falar:
– Naquela noite, quando
fomos dormir, eu não fazia ideia de que estava prestes a cometer um crime. Na verdade,
acho que muitas coisas não saíram bem como o planejado – o olhar de Dora ficou
distante por alguns instantes, como se pudesse visualizar o que estava contando – Eu me levantei no meio da noite e para ir à cozinha buscar um copo d’água. Mas
no caminho, ouvi sussurros. Imediatamente reconheci a voz de Phillip, que
tratava com um homem alto, que ocultava o rosto sobre a sombra do chapéu. Eles falavam
sobre o assassinato de um homem, que era você. Ora, Vicent, mas se você
morresse... se você fosse assassinado, eu jamais colocaria as mãos na fortuna
dos Mason! Eu sempre soube! Sempre soube que eras filho de Marcus! Só alguém
muito imbecil não o perceberia! Não, você não poderia morrer. Então decidi tudo
muito depressa: eu mataria Phillip. Eu o mataria para que você pudesse
sobreviver; e, como único herdeiro, seria dono de tudo o que Marcus o deixasse
como herança.
– Eu não... entendo – sibilei – Quem morreu naquela noite foi...
– É, mais uma vez, as
coisas não correram como planejei – interrompeu-me – Quando eu corri até a cozinha e agarrei uma
enorme faca para matar Phillip, não reparei que o velho Marcus Mason descia as
escadarias, tamanha minha adrenalina. Sofria de insônia, aquele velho porco. Voltei
para a sala de estar, pronta para esfaquear seu irmãozinho quando ele voltasse
para dentro da casa. Mas ao chegar lá, fui pega por Marcus! Imediatamente, ele
percebeu o que eu estava a fazer. Dei três passos para trás e ele veio para
cima de mim, com os olhos faiscando de ódio e paternalismo. Que escolhas eu
tinha? Era ele ou eu.
– Sua desgraçada! – gritei, ficando de pé – Você matou o meu pai! Você o matou e me fez acreditar
que meu irmão o fizera! Sua vadia, eu o matei! Eu o matei e ele era inocente!
– Inocente? – Dorota riu
ruidosamente – Você ouviu o que eu acabe de dizer? Ele pretendia matar você,
seu imbecil! Eu salvei a sua vida!
– Cale essa boca imunda,
sua...
– Olha como trata uma
mulher armada, Vicent Nicholls! Seu inútil, nem mesmo para herdar o sobrenome
do pai você serviu! – debochou, depois fez questão de acrescentar: – És um
bastardo, Vicent!
Antes que pudesse pensar
em qualquer coisa, eu agarrei-lhe a mão com a arma da mesma maneira que tinha
feito com Christopher no dia em que o conheci. Mas era mais fácil controlar uma
mulher, que um rapaz. Ela atirou para cima, mas os dois tiros meramente fizeram
buracos no teto. De uma maneira muito habilidosa, ela se desvencilhou de mim e
conseguiu se soltar. Numa lufada de adrenalina, corri escada acima, quando um novo
tiro atingiu a parede logo atrás de mim. Ofegante, ouvi quando ela gritou:
– Você pode tentar,
querido. Mas não vai conseguir escapar de mim!
Então era assim que as
coisas terminariam. Eu seria morto por minha própria esposa. Mas naquele
momento eu não sabia que ainda havia muitos imprevistos esperando para
acontecerem. Uns bons; outros nem tanto.
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Link do Capítulo XVI (anterior)
Link do Capítulo XVIII (próximo)
Sempre desconfiei da Dorota... rs
ResponderExcluirEste foi, com certeza, o melhor capítulo até agora.
Aguardo os próximos ansiosamente.
Lê, depois de ler tantos Sidney Sheldon e tantos Ken Follett, você já é "expert" em descobrir quem, na verdade, é o malvado da história!
ExcluirFico feliz que tenha gostado, logo mais sai o próximo capítulo... só estou buscando um pouco de inspiração!
Abraço!