Andava sozinho pelas ruas desertas da madrugada. Nem sequer
conseguia encontrar um motivo sensato para explicar sua súbita vontade de
caminhar no meio da noite, depois de acordar de um pesadelo. Mesmo assim, foi.
Lembrou do sonho. E chorou baixinho, mesmo sabendo que
ninguém o escutaria, ainda que fizesse barulho. A cidade dormia. As pessoas
dormiam. Os prédios dormiam. E a vida, sonolenta, arrastava-se de um jeito que
beirava a hipocrisia: divertindo-se dos dias sarcásticos que ele atravessava
sem entusiasmo.
Olhou para o céu com indiferença, e um enorme pingo de
chuva atingiu-lhe a testa. Era o primeiro, dos muitos que o sucederam. Em poucos
segundos, a rua foi acometida por uma tempestade repentina. E, sem
guarda-chuvas e sem casaco, a opção era voltar para casa; onde ninguém esperava
seu retorno. Onde ninguém notara sua partida. Onde ninguém se lembrava dele.
Mesmo morando com os pais, estes lhe eram estranhos. Mas
estranhos diferentes: desses que incomodam. Ainda que acompanhado, era sozinho
nesse mundo. E o pecado que cometeu para merecer tal punição foi esse: tentar
ser ele mesmo. Quando o dia amanheceu, ele foi dormir. E nunca mais voltou a acordar.
Verdadeiramente, dos venenos desse mundo, a solidão é o
mais mortal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário